Nosso tempo e o controle judicial dos atos administrativos


O controle judicial dos atos administrativos tem saltado de ponto teórico da doutrina jurídica para o noticiário cotidiano: no acontecimento mais recente, ato privativo do Presidente da República – a nomeação de Ministros – foi submetido ao escrutínio do Judiciário, a partir de iniciativa popular.

Além dos próprios envolvidos, que agem, naturalmente, na defesa de seus interesses, vozes abalizadas têm se insurgido contra a hipótese, sob a alegação de que tal controle signifique, apenas e tão somente, a ingerência de um Poder sobre o outro.

A preservação da discricionariedade administrativa nos limites assegurados pela lei é um dos cânones do Direito Administrativo; todavia, é com força de magna lei que o artigo 37 da Constituição Federal prevê que “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.”

Quer isso dizer que a discricionariedade administrativa há de ser exercida observando-se os princípios gerais que regem a Administração Pública, com destaque para aquele que se refere à moralidade, o qual, no magistério da Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “exige da Administração comportamento não apenas lícito, mas também consoante com a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia comum de honestidade.”

O Brasil descobre, portanto - ainda que três décadas após a vigência da Constituição de 88 - que não basta à Administração Pública, no exercício do poder discricionário, ater-se aos aspectos extrínsecos do ato: exige-se que se ultrapasse a mera formalidade, para que tais atos sejam dotados de carga valorativa que esteja afinizada com os valores eleitos pelo povo, e expressados pelo ordenamento que o rege.

Quando cidadãos vão às portas do Judiciário questionar a moralidade de determinado ato administrativo, mais do que a ingerência de um Poder sobre o outro, o que se tem é o exercício do Poder Popular por quem de direito – “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição” - a maturar a feliz ideia de um maior e melhor controle da Administração Pública, dependente, até hoje, da iniciativa oficial, sempre mais sujeita à oportunidade e conveniência da própria Administração que se quer ver fiscalizada.

Após décadas em que a corrupção tem prevalecido com tintas exteriores de legalidade, percebe-se um clamor, nos diversos setores da sociedade, por uma cultura administrativa que traduza o verdadeiro espírito republicano: que os três Poderes possam ouvi-lo.
 
 
Dra. Luana Araujo

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