O crescente dano moral no Direito de Família



Numa atualidade moderna, progressiva e cada vez mais liberal, em que a Justiça está em foco e a sociedade se informa cada vez mais sobre os seus direitos, o Poder Judiciário se vê diante de um cenário desafiador. Com a evolução constante do homem, diariamente os cidadãos buscam cada vez mais utilizar seu direito fundamental de que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;” (Constituição Federal, artigo 5º, XXXV).

Não é mais crível que apenas se aceite ou “deixe para lá” o que é legalmente devido. E o melhor, nem sempre somente o que é legalmente previsto, mas também o que a constante atuação dos Tribunais cria, diante das situações de fato que ocorrem no dia-a-dia da população e lhes são levadas à apreciação e julgamento.

E nesse tema, o direito de família e sucessões é muito vivo, pois sua base é totalmente fática, e, literalmente, cada caso é um caso. Esta seara do direito prova que toda regra comporta exceções; às vezes, muitas. Os Juízes de Família são submetidos a uma miscelânea de ações com minúcias inacreditáveis, muitas vezes geradoras de direitos nem sempre previstos em lei.

Citou-se o progresso informativo da sociedade, pois há um direito que vive na boca do povo: o “dano moral”. E, por incrível que pareça, ele está sendo corriqueiramente citado e pleiteado em ações judiciais nas Varas de Família e Sucessões dos Tribunais Brasileiros.

A jurisprudência pátria tem posicionamento firme, sempre reiterado em julgamentos, no sentido de que “No âmbito do Direito de Família, não há a possibilidade de averiguação de responsabilidades patrimoniais pelo fim das relações familiares.”.[1] Mas, como dito, as exceções são presentes quando o assunto é direito, sentimento, afeto e casuística.

Se tornou uma realidade ao Advogado se deparar com notícias diárias acerca de novos entendimentos sobre danos morais em relações familiares, inclusive provenientes dos Tribunais Superiores.

Hodiernamente, diversas são as hipóteses em que o dano moral vem sendo reconhecido e indenizado:

a) abandono afetivo e material; 
b) traição, desde que haja exposição vexatória ao traído ou risco de contágio de doença venérea, dentre outras hipóteses; 
c) exposições indevidas do parceiro em redes sociais; 
d) casamentos anulados por erro quanto à pessoa (normalmente “enganos” relacionados ao sexo ou opção sexual do parceiro); 
e) mentiras quanto à paternidade de filhos (descoberta da verdadeira paternidade após anos).

Ou seja, o intuito deste artigo é demonstrar, com rol exemplificativo de situações reais, como atos ilícitos vêm sendo reconhecidos e punidos pelo Poder Judiciário no âmbito das relações familiares (que são internas, em regra). 

Obviamente é necessário sempre ter o cuidado de resguardar os cidadãos, para que ocorra a mínima intervenção estatal nas relações privadas; afinal, não é dever do Estado, nem saudável, que este fique a toda hora regulando como as pessoas devem viver, inclusive por encontrar óbice no império do Estado Democrático de Direito.

É uma conquista social saber que não só a lei, mas principalmente os Tribunais estão em frequente progresso no ‘direito das famílias’ (como denomina a boa doutrina atual), regulando situações quando e como preciso, de acordo com a realidade e não com convicções pessoais, muitas vezes criadas ou embasadas em leis ou estereótipos retrógrados.

Portanto, conclui-se que cabe ao direito abraçar a realidade de seus tutelados e garantir a melhor aplicação da lei (e direitos). Assim, com bom senso e almejo de evolução, a justiça se tornará algo inerente à sociedade, mesmo que para isso tenha de se reconhecer um “dano moral” como marco de uma relação familiar, o que não é a regra e somente aplicável se comprovado e cabível ao caso específico.


[1] Apelação Cível nº 70065828030, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Data de Julgamento: 12/01/2016;


Dr. Lucas Marshall Santos Amaral
Departamento: Família e Sucessões/ Indenizatórias


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Socorro - 1 litro de OLUC pode contaminar 1.000.000 de litros de água



Na última semana de janeiro, a imprensa noticiou que a CETESB está investigando o vazamento de cerca de 500 litros de óleo pela galeria de esgoto do Rio Tietê, na altura da ponte da Vila Maria.

O noticiário não precisou qual o tipo de óleo, porém, pelas imagens nos parece se tratar de óleo lubrificante usado e/ou contaminado também conhecido como OLUC. Se for OLUC, aproximadamente 500.000.000 de litros de água foram contaminados.
 Não é por acaso que a legislação e a fiscalização estão cada vez mais rígidas.

A Resolução Conama nº 362/2005 trata do recolhimento, coleta e destinação final de OLUC e estabelece, em seu artigo 1º que: “Todo óleo lubrificante usado ou contaminado deverá ser recolhido, coletado e ter destinação final, de modo que não afete negativamente o meio ambiente e propicie a máxima recuperação dos constituintes nele contidos, na forma prevista nesta Resolução”.

Os produtores e os importadores de óleo lubrificante devem coletar, ou garantir a coleta, e dar destinação final ao OLUC, respeitando a proporção do óleo lubrificante acabado que colocarem no mercado, ou seja, deverão atender aos percentuais mínimos estabelecidos de coleta de acordo com a participação de cada empresa no mercado, por região e país.

Este percentual de coleta em cada uma das regiões leva em consideração as disparidades de coleta de OLUC nas diferentes regiões do país (Portaria Interministerial MME/MMA nº 100/2016).

O IBAMA, atuando em conjunto com a ANP (Agência Nacional do Petróleo) e/ou órgãos estaduais de meio ambiente, é responsável pela fiscalização do cumprimento das metas de coleta, fixadas pelos ministérios do Meio Ambiente e de Minas e Energia. 

O OLUC é um resíduo de característica tóxica e persistente e, caso descartado incorretamente, coloca em risco o meio ambiente e a saúde pública, tornando-se um grande poluidor ambiental.

Se descartado diretamente no solo pode contaminar os mananciais e lençol freático, comprometendo a qualidade da água, recurso natural tão importante à sobrevivência humana, e, como amplamente divulgado, se descartado nas bacias hidrográficas, 1 litro de OLUC pode contaminar até 1.000.000 de litros de água.

A prática recomendada tecnicamente para evitar que este resíduo perigoso seja descartado no meio ambiente é o envio do OLUC para reciclagem e recuperação de seus componentes úteis, garantindo a reintegração do óleo usado ao fluxo de produção após a remoção dos contaminantes, fechando assim o ciclo de vida do produto.

Este processo industrial é conhecido como rerrefino e é de suma importância para o desenvolvimento sustentável do país, pois garante a reposição do produto no mercado, poupa os recursos naturais e preserva o meio ambiente.

Para possibilitar o controle do cumprimento das metas de coleta fixadas, os fabricantes ou produtores de óleos lubrificantes são obrigados a prestar informações nos sistemas oficiais de controle.

Os mesmos necessitam de registro, bem como informar o volume total comercializado e o quanto deste volume é dispensado de coleta.

O cruzamento de dados é feito, e tendo como base as metas de coleta estabelecidas, atualmente, pela Portaria Interministerial nº 100/2016, o sistema calcula e mostra qual empresa não atingiu o mínimo a ser coletado. Como as metas são anuais, a obrigação de cumprir é anual.

Em que pese a legislação deixar claro que todo OLUC deve ser encaminhado para o rerrefino, várias empresas produtoras e/ou importadoras não têm cumprido a meta anual estabelecida.

O IBAMA, no âmbito de suas atribuições federais, cumpre seu papel fiscalizatório e, caso constatado que a empresa fiscalizada não cumpriu a meta de coleta anual, tem a competência de aplicar sanções, dentre elas a multa.

Ressalta-se que o IBAMA vem multando muitas empresas por descumprimento de obrigações previstas na legislação ambiental em relação à destinação de OLUC.

Embora a iniciativa seja necessária e na maioria das vezes correta, erros acontecem e as empresas encontram dificuldade em cumprir os procedimentos legais para demonstrar que atenderam às metas exigidas.

Nos parece que estamos no caminho correto e que a melhor maneira de obter ganhos para o meio ambiente é o diálogo entre os órgãos públicos e a iniciativa privada.

Dra. Ana Lucia Lunardi
Departamento: Meio Ambiente e Sustentabilidade




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Nosso tempo e o controle judicial dos atos administrativos


O controle judicial dos atos administrativos tem saltado de ponto teórico da doutrina jurídica para o noticiário cotidiano: no acontecimento mais recente, ato privativo do Presidente da República – a nomeação de Ministros – foi submetido ao escrutínio do Judiciário, a partir de iniciativa popular.

Além dos próprios envolvidos, que agem, naturalmente, na defesa de seus interesses, vozes abalizadas têm se insurgido contra a hipótese, sob a alegação de que tal controle signifique, apenas e tão somente, a ingerência de um Poder sobre o outro.

A preservação da discricionariedade administrativa nos limites assegurados pela lei é um dos cânones do Direito Administrativo; todavia, é com força de magna lei que o artigo 37 da Constituição Federal prevê que “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.”

Quer isso dizer que a discricionariedade administrativa há de ser exercida observando-se os princípios gerais que regem a Administração Pública, com destaque para aquele que se refere à moralidade, o qual, no magistério da Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “exige da Administração comportamento não apenas lícito, mas também consoante com a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia comum de honestidade.”

O Brasil descobre, portanto - ainda que três décadas após a vigência da Constituição de 88 - que não basta à Administração Pública, no exercício do poder discricionário, ater-se aos aspectos extrínsecos do ato: exige-se que se ultrapasse a mera formalidade, para que tais atos sejam dotados de carga valorativa que esteja afinizada com os valores eleitos pelo povo, e expressados pelo ordenamento que o rege.

Quando cidadãos vão às portas do Judiciário questionar a moralidade de determinado ato administrativo, mais do que a ingerência de um Poder sobre o outro, o que se tem é o exercício do Poder Popular por quem de direito – “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição” - a maturar a feliz ideia de um maior e melhor controle da Administração Pública, dependente, até hoje, da iniciativa oficial, sempre mais sujeita à oportunidade e conveniência da própria Administração que se quer ver fiscalizada.

Após décadas em que a corrupção tem prevalecido com tintas exteriores de legalidade, percebe-se um clamor, nos diversos setores da sociedade, por uma cultura administrativa que traduza o verdadeiro espírito republicano: que os três Poderes possam ouvi-lo.
 
 
Dra. Luana Araujo

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Conheça o contrato de trabalho intermitente



Dentre as inúmeras alterações e inovações na legislação trabalhista trazidas pela Lei nº 13.467/17 – reforma trabalhista - em vigor desde novembro do ano passado, destaquemos a regulamentação de uma nova modalidade de contrato de trabalho, qual seja, o intermitente, previsto no § 3º do artigo 443 da CLT, que dispõe:

Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.

A princípio ressalta-se que a característica básica desta modalidade de contrato é a prestação de serviços não contínuo mesmo que havendo vínculo empregatício entre as partes. Permitindo ao empregado, prestar serviços intermitentes para vários empregadores, com diversos contratos de trabalho a gerir, acarretanto, consequentemente boas formas de auferir renda e sendo dele a gestão de sua própria mão de obra.

Nesta modalidade, o trabalhador intermitente, passa a ter opção de escolha para executar ou não determinado serviço pelo período para o qual foi convocado, ou até mesmo se recusar a prestá-lo, sem qualquer justificativa e punição. Assim, no contrato intermimente, é do empregado a gestão pessoal de sua mão de obra, no qual ele passa a gerir sua agenda de tarefas cotidianas para o atendimento, de seus tantos quantos empregadores tiver.

A novidamente trazida aos  empregadores é a possibilidade de contratatação de empregados para trabalhar esporadicamente, pagando-lhes apenas pelo período em que prestarem serviços, ou seja, o contrato de trabalho intermitente surge como uma modalidade destinada à eventos que necessitam, em momentos específicios de aumento de mão de obra, onde a previsibilidade é uma inconstância.

Ocorre que, para que as empresas possam utilizar deste tipo de contrato, alguns cuidados são necessários no momento da contratação. Neste aspecto, é importante mencionar que a Medida Provisória, nº 808/17, publicada em 14 de novembro de 2017, especificou que para esta nova modalidade, o contrato deverá ser firmado por escrito, registrado na carteira de trabalho e conter o local de prestação de serviços, bem como o prazo para pagamento da remuneração.

Essas especificações determinaram ainda que o  valor da hora não poderá ser inferior ao valor da hora do salário ou o pago aos demais funcionários que possuem a mesma função e o adicional noturno também é devido, caso a jornada ocorra em período noturno. E como este contrato presume a aceitação do empregado, a MP também determinou que o prazo para aceitei da prestação de serviço, deverá ser em 24 horas, bem como que seu silêncio presumirá à recusa.

Ademais, é válido mencionar que a MP também especificou que o auxílio-doença será devido ao segurado da Previdência Social, desde o momento da sua incapacidade, vedada a aplicação do § 3º da Lei nº 8.213/1991. Logo, caberá à Previdência Social arcar com o auxílio-doença desde o início da incapacidade, diferentemente do funcionário comum, que recebe o benefício do empregador nos 15 primeiros dias de afastamento. Com relação ao o tempo em que este não estiver em atividade não é considerado como tempo à disposição do empregador, e que se não houver qualquer convocação para trabalho, após passado 01 (hum) ano da última, o contrato de trabalho será rescindido.

Sobrevele-se que o contrato intermitente traz uma nova realidade de convite e aceite, conforme já disposto, que sem dúvida é sua marca registrada, não presumindo qualquer justificativa de fazé-lo entre as partes. Também deve-se lembrar, que o contrato intermitente é um contrato como qualquer outro. Logo, além da remuneração devida, também é se faz necessário a quitação de todos os acessórios legais, tais como férias +1/3, 13º salário, DSR, adicionais legais, contribuição previdenciária e FGTS.


Por fim, é cediço destacar que, embora o contrato de trabalho seja uma nova modalidade criada pela Lei nº 13.647/17 – reforma trabalhista – justamente por ser um mecanismo novo, deve-se ter cautela para utilizá-lo, principalmente em decorrência de sua característica básica da não continuidade do trabalho, com vínculo de emprego, que ainda padece de interpretação doutrinária e jurisprudencial. Logo, antes de colocá-lo em prática, um bom acompanhamento jurídico especializado torna-se de grande valia, para evitar qualquer risco trabalhista futuro, envolvendo este tipo de contratação. 

 
Dr. Lucas Alves Lemos Silva
Departamento: Trabalhista e Relações Sindicais
 

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