A recente decisão do STF, que considerou a prevalência das Convenções Internacionais sobre o Código de Defesa do Consumidor, nos casos de pedidos de indenizações por extravio de bagagem
A responsabilidade civil atinge
às companhias aéreas por defeitos na prestação de serviços a seus consumidores,
independentemente de culpa, em razão do risco inerente da própria atividade
desenvolvida – transporte internacional de passageiros.
Extravio de bagagens,
atrasos, cancelamentos de voos e overbooking podem gerar indenizações aos
passageiros, em decorrência da ausência de segurança jurídica esperada.
O entendimento
majoritário da jurisprudência dos tribunais de justiça e do próprio Superior
Tribunal de Justiça[1]
é no sentido de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, tanto pela
existência de relação de consumo entre a empresa aérea e o passageiro, como
pela própria Constituição Federal, que elevou a defesa do consumidor à esfera
constitucional[2].
Com a aplicação do Código
de Defesa do Consumidor, permitia-se que a parte demonstrasse a extensão do
dano, seja patrimonial ou extrapatrimonial, e obtivesse a reparação integral do
dano. No entanto, empresas aéreas internacionais insistiam na aplicação das
convenções internacionais em detrimento da norma interna, como forma de limitar
o valor da indenização.
O embate chegou ao
Supremo Tribunal Federal[3], em 25.05.2017, oportunidade
em que, por maioria dos votos, os Ministros sinalizaram na linha de que as
convenções internacionais, ratificadas pelo Brasil[4], prevalecem sobre o Código
de Defesa do Consumidor, para casos de danos materiais de extravio de bagagem,
excluindo-se a indenização por dano moral.
A decisão foi
fundamentada no artigo 178 da Constituição Federal, exaltando a aplicação do
Pacto de Varsóvia e da Convenção de Montreal.
Neste sentido, dispôs o Relator,
Ministro Gilmar Mendes, no seguinte sentido:
“Por força do artigo 178 da
Constituição Federal, as normas e tratados internacionais limitadoras da
responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as
Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de
Defesa do Consumidor.”
A prevalência das
convenções internacionais sobre o Código de Defesa do Consumidor tem como principal
impacto o arbitramento (quanto) das indenizações pagas pelas empresas aéreas
aos consumidores lesados.
Isto se deve ao fato de
existir a previsão expressa de um limite ao total a ser reparado em se tratando
de extravio, na Convenção de Montreal[5].
O primeiro impacto direto
da decisão do Supremo, que teve como relator, como suscitado, o ministro Gilmar
Mendes, é o valor das indenizações que as aéreas internacionais têm que pagar
para restituições financeiras, indo na contramão do CDC, que, para estas situações,
permitia a reparação integral, desde que provado o dano.
O entendimento do Supremo
Tribunal Federal, que não foi unânime, também entendeu que o prazo
prescricional para o exercício ao direito da ação é de dois anos, contados da
chegada ao destino[6].
Neste aspecto, igualmente, houve redução do prazo, já que a norma interna (CDC)
prevê o prazo de cinco anos para o mesmo direito, a partir do conhecimento do
dano[7].
Ainda que com o condão
principal de uniformizar o valor indenizatório junto aos tribunais de justiça, não
há menor dúvida que se impôs a restrição a direitos: (a) não só pela limitação
do valor da restituição, mesmo que devidamente comprovada; (b) como na redução
do prazo para pleitear a indenização.
A prevalência das convenções internacionais sobre
o Código de Defesa do Consumidor deixa de responsabilizar integralmente as
empresas aéreas pela prestação de serviço defeituosa, já que evitará discussões
sobre o valor a ser indenizado.
Ou seja, considerando que
o artigo 22 da Convenção de Montreal dispõe sobre o teto da indenização em caso
de extravio de bagagem, pouco importará as reais extensões dos danos sofridos,
mesmo que devidamente comprovados pelo consumidor.
[1]
AgRg no
AREsp 141.630/RN
[2]AgRg no AREsp 388.975/MA
[3] RE 636.331/RJ
[5] Artigo 22, 2. Convenção de
Montreal: No transporte de bagagem, a responsabilidade do transportador em caso
de destruição, perda, avaria ou atraso se limita a 1.000 Direitos Especiais de
Saque por passageiro, a menos que o passageiro haja feito ao transportador, ao
entregar-lhe a bagagem registrada, uma declaração especial de valor da entrega
desta no lugar de destino, e tenha pago uma quantia suplementar, se for
cabível. Neste caso, o transportador estará obrigado a pagar uma soma que não
excederá o valor declarado, a menos que prove que este valor é superior ao
valor real da entrega no lugar de destino.
[6] Artigo 35, 1. Convenção de
Montreal: O direito à indenização se extinguirá se a ação não for iniciada
dentro do prazo de dois anos, contados a partir da data de chegada ao destino,
ou do dia em que a aeronave deveria haver chegado, ou do da interrupção do
transporte.
[7]
Art. 27, CDC: Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos
danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste
Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e
de sua autoria
Dra.: Heloísa Bottecchia Cilurzo Moya
Departamento: Recuperação de Tarifas Água / Esgoto