Lei Antiterrorismo e Operação Hashtag
Lei Antiterrorismo e Operação Hashtag
Em meio à crise política, em março de 2016 foi sancionada lei que tipifica o crime de terrorismo no País, definindo a prática como “a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública”, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião. As penas variam de 5 a 30 anos de prisão.
A Lei 13.260/2016 foi publicada em edição extra do Diário Oficial do dia 17/3/2016, com oito vetos ao texto aprovado no Congresso Nacional. O projeto de lei classificava como atos de terror “incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado”; “interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados” e “fazer, publicamente, apologia de fato tipificado como crime nesta lei”.
Além disso, a nova lei traz conceitos abertos como "provocar terror social ou generalizado" para a caracterização do crime de terrorismo, dando margem para que a lei seja aplicada de forma arbitrária para coibir manifestações sociais legítimas.
É importante ressaltar que o projeto na realidade não cria nenhum crime novo. Todas as condutas que a lei traz como sendo práticas terroristas já são puníveis pelo nosso Código Penal, o que inclusive levanta reflexões sobre sua necessidade. Com o cenário de criminalização de movimentos sociais e manifestações que tem se intensificado desde as jornadas de junho de 2013, a preocupação da sociedade civil é que essas iniciativas busquem reprimir ainda mais os protestos no País.
No entanto, hoje a 14ª vara da Justiça Federal de Curitiba autorizou a deflagração da Operação Hashtag contra a célula do ISIS no Brasil. Foram expedidos 12 mandados de prisão temporária por 30 dias, com possibilidade de renovação por mais 30.
A Policia Federal vinha monitorando os telefones e e-mails dos integrantes do grupo, que pregam intolerância racial, de gênero e religiosa, além do uso de armas e táticas de guerrilha.
Os nomes dos detidos serão mantidos em sigilo, porém eles serão enquadrados na nova Lei 13.260, de 16 de março de 2016, que disciplina o terrorismo. Os artigos 3º e 5º estipulam como crime: "promover, constituir, integrar ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista; realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito".
Assim, se de um lado tememos a repressão aos protestos no País, por outro podemos ficar mais seguros e tipificar os supostos atos terroristas dos quais viramos foco, tendo em vista a iminência do início dos jogos olímpicos em nosso território nacional.
Roberto Chaves Bell
Pokémon Go e os Impactos Jurídicos da Realidade Aumentada
Pokémon Go e os Impactos Jurídicos da Realidade Aumentada
Atualmente, a grande maioria da população conhece, é adepta ou já tem noções sobre o que é o Pokémon Go. Contudo, para aqueles que ainda não conhecem, trata-se de um aplicativo de jogo de realidade aumentada, no qual o jogador consegue capturar, treinar e batalhar com criaturas virtuais denominadas “pokémons”.
A realidade aumentada traz a integração entre informações virtuais e visualizações do mundo real, ou seja, o jogador consegue, através da câmera do smartphone ou tablet, jogar no aplicativo como se as criaturas estivessem presentes no ambiente real.
O desenvolvedor do jogo, Niantic, fez um mapeamento geográfico de cada país onde lançou o game, possibilitando que o usuário percorra diversas localidades reais atrás dos pokémons, utilizando somente o sinal GPS de seu celular.
Porém, a realidade aumentada pode levar o usuário à alienação do mundo real e das implicações que suas ações podem gerar. Não se trata apenas de pequenos incidentes, tais como empurrões e tropeços nas calçadas. Muitos acidentes relacionados à falta de atenção e cuidado dos usuários já começaram a aparecer no território brasileiro, além de furtos, assaltos, invasões em propriedades privadas, acidentes de trânsito ocasionados pelo uso do jogo concomitantemente com a direção e demais questões a serem tratadas neste artigo.
Sem dúvida, em razão dos reflexos visualizados no mundo real, o Direito havia de se manifestar. Primeiro, pela clara relação de consumo estabelecida pela empresa fornecedora (Niantic) e o consumidor (usuário do game), de acordo com as normas do Código de Defesa do Consumidor, se impõe ao desenvolver a observância de direitos e princípios basilares da relação de consumo. Segundo, pelas diversas ocorrências que, eventualmente, prejudiquem terceiros, ocasionando assim, lavratura de boletins de ocorrência, reclamações no Procon e até ações indenizatórias.
Além disso, em se tratando do Brasil, quando algo viraliza entre os usuários é difícil manter o controle, tal qual prever o alcance que o mero aplicativo pode impactar no cotidiano dos brasileiros.
• FURTO / ROUBO / ACIDENTES PESSOAIS
Já era esperado que perambular pelas ruas no Brasil com um smartphone nas mãos, totalmente imerso na realidade aumentada, chamaria atenção de assaltantes e pessoas mal-intencionadas. Pois bem, com menos de um mês de lançamento do jogo no Brasil são notórios casos de furto e roubo dos celulares, principalmente nas grandes capitais.
Sabendo que os usuários se permitem estar vulneráveis, ao concordarem em jogar Pokémon Go caminhando pelas ruas com seus celulares à mostra, e por muitas vezes desacompanhados e em locais ermos, acabam se tornando alvo para o aumento de tais práticas delitivas.
Em face disso, já existem anúncios de empresas seguradoras oferecendo seguro de acidentes pessoais “para caçadores pokémons”.
A cobertura está relacionada aos danos sofridos pelos usuários do Pokémon Go e demais games de realidade aumentada, durante o uso dos aplicativos. Contudo, o interessado deve se precaver de soluções milagrosas consultando um advogado no ato da contratação, para que seja analisado o rol de cobertura do serviço oferecido.
Outra novidade que surgiu diante dos curiosos problemas, às vezes trágicos, sofridos e ocasionados pelos treinadores pokémons, é o seguro de vida para os usuários do aplicativo. Considerando o ímpeto dos jogadores em se aventurarem pela cidade, distraídos com o smartphone, é uma nova solução que afirma oferecer socorro a qualquer momento para tombos e acidentes graves, além de transporte para hospitais e unidades de socorro.
Ainda, apesar de haver prontamente a relação de consumo entre o desenvolver do game e o usuário, não é razoável responsabilizar a empresa pelo mau uso do seu produto, uma vez que, o aplicativo, de tempos em tempos, exibe um alerta aos consumidores com a seguinte mensagem: “Remember to be alert at all times. Stay aware of your surroundings” (Lembre-se de estar atento em todos os momentos. Fique atento ao seu entorno).
Dessa forma, não se vislumbra assertiva a possibilidade de responsabilização do desenvolvedor por quaisquer acidentes pessoais ou danos a outrem, em razão da distração provocada por seu aplicativo, justamente porque este já alerta seus consumidores/usuários dos possíveis riscos.
• INVASÃO DE PROPRIEDADE PRIVADA / ACESSO ÀS ÁREAS RESTRITAS DESLOCAMENTO DO JOGADOR VIA GPS
Outro fato incomum advindo do uso do aplicativo trata-se do aparecimento de criaturas virtuais (pokémons) em todas as localidades. O jogo não possui a consciência real de propriedade privada, área restrita, local ermo, violento ou perigoso, por isso os jogadores estão cada vez mais sendo estimulados a transpassar barreiras a fim de capturar determinados pokémons.
O primeiro caso interessante a ser mencionado - também o primeiro caso vultoso no Brasil - ocorreu no Fórum da Comarca de Atibaia/SP, quando um grupo de 25 jogadores invadiram a sala de audiência da 4ª Vara de Família para que capturassem um pokémon. Entretanto, apesar das salas de audiências habitualmente serem de livre acesso ao público, as audiências sobre casos de família são protegidas por segredo de justiça e, portanto, naquele caso, todos estavam violando o sigilo judicial.
Além de conturbarem a audiência, insistiram na captura mesmo após determinação do magistrado para que se retirassem. Por isso os invasores foram encaminhados pela segurança do Fórum à delegacia, em decorrência da voz de prisão proferida pelo magistrado.
Nesse caso, o grupo de jogadores encaminhados para a delegacia só prestou depoimento e foi liberado. No entanto, deve-se ressaltar que o que ocorreu na referida audiência é previsto no Código Penal como desacato, sendo até penalizado com detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos ou multa. Os usuários do aplicativo devem se conter, pois desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela é tipificado como crime.
Tal qual ocorreu nos Estados Unidos, o desenvolver do aplicativo posicionou alguns pontos de captura ou de batalha das criaturas virtuais, conhecidos como ginásios, em frente à residência de pessoas. Esses ginásios possibilitam que um jogador batalhe contra outro jogador com os pokémons já capturados. Com isso, a movimentação nas redondezas e inclusive em frente à entrada da residência de alguém passa a estar povoada de usuários do aplicativo causando perturbações e desconfortos para todos os residentes.
Imigrando o caso para o território brasileiro, supondo que o mesmo também esteja acontecendo com alguma residência privada, a Constituição Federal Brasileira, em seu artigo 5º, prevê a inviolabilidade da intimidade e da vida privada assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral que possa sobrevir de sua violação.
Assim, utilizando-se do que preceitua o art. 17 do Código de Defesa do Consumidor, é possível equiparar o residente violado ao consumidor nas situações em que o fornecedor é responsável pelo fato do produto, uma vez que o desenvolvedor é quem, aleatoriamente, direciona e posiciona os ginásios e pokestop (local marca no mapa do aplicativo para que usuários coletem itens do jogo) e, portanto, deve ser responsabilizado por futuros prejuízos as vítimas do evento.
Aliás, pode ainda vir a surgir questões em relação ao deslocamento necessário para uso do aplicativo entre os usuários. Conforme mencionado acima, sabe-se que o mapa do jogo está integrado com o mapa do mundo real. No entanto, na tela do jogo a imagem não condiz com a realidade e, por essa razão, muitos jogadores acabam sendo direcionados a localidades iminentes de ocorrência de crime, violência ou situações desagradáveis.
A dinâmica do jogo, no que tange às direções e locais, é similar a do GPS, Waze, Google Mapas e demais aplicativos do segmento que possuem um mapeamento geográfico de todas as ruas, sentidos e informações de trânsito necessários para formar uma rota até o destino informado. Na maioria dos aplicativos citados há a opção de indicação de preferência por vias hierárquicas ou caminhos mais curtos, mais rápidos, e se nem nesses casos é possível responsabilizar o desenvolvedor do aplicativo por direcionamento de rota perigosa, que dirá trazer o ônus para as informações via GPS apresentadas pelo desenvolvedor do Pokémon Go.
Além do mais, os usuários do game têm autonomia para escolher o caminho que bem entenderem, posto que não há indicação de melhor rota e nenhuma forma de direcionamento fornecida pelo aplicativo. Há, ainda, possibilidade de consulta de onde estão localizados os pokestop, mais um fator que, em tese, afasta a responsabilidade do desenvolvedor. Contudo, os jogadores devem estar alertas sobre quaisquer anormalidades contidas no jogo, pois havendo erro causador de danos e prejuízos, ao próprio usuário ou à terceiros, a responsabilidade deve ser analisada caso a caso.
• INFRAÇÃO DE TRÂNSITO / DIREITO DE REGRESSO DA SEGURADORA
Sabe-se que o território nacional foi “ocupado” por milhares de pokémons em sua extensão, que não respeitam os limites de ruas, parques, áreas restritas, propriedades privadas, residências, pontes e até lagos, mares e rios. Muitos jogadores passaram a utilizar o aplicativo enquanto dirigem seus veículos a fim de expandir a possibilidade de captura dos pokémons.
Desde 2012 já havia estudos que levantaram números significativos acerca do uso do celular ao volante, mais precisamente afirmando que os riscos de acidentes no trânsito aumentam em 400% (quatrocentos por cento) com a distração em decorrência do uso de celular pelos condutores.
Ainda, além do risco que os usuários do aplicativo correm ao insistirem no uso do smartphone simultaneamente com a direção de um veículo, terceiros podem ser afetados pelo descuido e falta de atenção indispensáveis na condução do veículo, ocasionando colisões ou, quem sabe, atropelamentos.
Segundo o Código de Trânsito Brasileiro, o uso de celular na condução do veículo, seja por viva-voz ou fone de ouvido, trata-se de infração de trânsito média com penalidade de multa de R$ 85,00 (oitenta e cinco reais) e que soma quatro pontos na CNH (Carteira Nacional de Habilitação), de acordo com o artigo 252, inciso VI. Além disso, a normativa de trânsito brasileira prevê também como infração média a condução de veículos com apenas uma das mãos, que é justamente o caso dos “caçadores pokémons”, que utilizam o aplicativo de forma irresponsável, infringindo, ainda, o artigo 169 do mesmo Codex, que trata da direção sem atenção ou sem os cuidados indispensáveis à segurança do condutor, passageiro e terceiros alheios à situação.
Os usuários do game devem inclusive ter em mente que, provocando uma colisão de veículos ou outro acidente de trânsito que gere prejuízos, a respectiva reparação de danos por parte da seguradora – havendo contrato de seguro – pode acarretar no futuro desembolso dos valores indenizados por esta (Ação Regressiva).
Aliás, é entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que a seguradora sub-roga-se nos direitos do segurado, o que significa dizer que é possível o ressarcimento do que foi despendido na reparação dos danos, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado.
Hipoteticamente, se um jogador de Pokémon Go estiver utilizando o aplicativo durante a condução de seu veículo e houver uma colisão, a seguradora responsável pelo pagamento - até o limite previsto na apólice - poderá requerer em juízo o ressarcimento dos valores, tendo em vista a responsabilidade civil do real causador do dano, uma vez que a violação das normas de trânsito brasileira acarreta no Direito de Regresso pela seguradora.
Comumente é prevista em apólices de seguro uma cláusula expressa sobre “Perdas de Direitos”. Nela é possível verificar se a conduta do usuário do aplicativo traria o agravamento intencional do risco objeto do contrato, e em razão disso, isentaria a seguradora de qualquer obrigação decorrente do referido contrato. É válida a análise jurídica do referido contrato para que sejam evitados futuros percalços em um eventual acidente de trânsito.
Quanto ao ‘real causador do dano’, imagino que não vislumbre razoabilidade qualquer tentativa de responsabilizar a empresa desenvolvedora, Niantic, pelos acidentes e colisões ocasionados por seus usuários, vez que sempre que a movimentação é aumentada bruscamente o próprio jogo identifica a velocidade advinda de um meio de transporte e exibe o seguinte alerta: “You are going too fast! Pokémon Go should not be played while driving. ” (Você está indo muito rápido! Pokémon Go não deve ser jogado enquanto dirige); sendo que a tela só é liberada se o jogador clica em “I’m a passenger” (Eu sou um passageiro).
• DEMISSÃO POR JUSTA CAUSA
Por último, engana-se quem pensa que Pokémon Go se trata de um jogo só para crianças e adolescentes. O jogo teve tamanho sucesso que invadiu os smartphones das pessoas de todas as idades. Contudo, o problema que acompanha essa situação é a distração em ambiente e expediente de trabalho.
Os empregadores que se sentirem prejudicados pela queda de desempenho dos empregados pode vir a aplicar advertências, punições ou até mesmo demissões por justa causa.
Isso porque, a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT prevê a hipótese de rescisão do contrato de trabalho quando houver desídia no desempenho das respectivas funções (art. 482, alínea “e”), bem como se o empregador já houver conferido advertência em outras oportunidades sobre o uso do game ou mesmo do aparelho celular, conferindo ato de indisciplina ou de insubordinação pelo empregado (art. 482, alínea “h”). Em ambas as hipóteses o empregador está acobertado pela demissão por justa causa, se assim optar.
Além disso, a Justiça do Trabalho tem entendimento consolidado acerca do uso de celulares, smartphones e demais aparelhos eletrônicos em ambiente de trabalho, o que corrobora para a rescisão de contrato de trabalho sem grandes transtornos.
Quanto a isso, os “caçadores pokémons” devem estar atentos às advertências, bem como procurar conhecer as normas internas de sua empresa para que se evitem surpresas fora da realidade aumentada.
Nota-se que os impactos de um simples aplicativo podem transcender os limites individuais do usuário, de sorte que todos devem manter o bom senso para que esse aplicativo cumpra sua função, a saber entretenimento e diversão, evitando problemas para si e, principalmente, para terceiros.
Jéssica Silva Mazza
Os impactos do Novo Estatuto (Lei n.º 13.146/2015) e das mudanças na Legislação Processual Civil para as pessoas com deficiência
Os impactos do Novo Estatuto (Lei n.º 13.146/2015) e das mudanças na Legislação Processual Civil para as pessoas com deficiência
No mês de janeiro deste ano, entrou em vigor o Estatuto da Pessoa com Deficiência, também conhecido como Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, assegurando direitos e liberdades de forma mais ampla a essa parcela da população, garantindo-lhe mais igualdade, mais dignidade, mais prioridades e representando um grande avanço para a sociedade como um todo.
Entre outras coisas, o Estatuto dispõe sobre o direito à vida, o acesso à educação inclusiva, saúde, moradia, trabalho, cultura, esporte, lazer, mobilidade, informação, tecnologia etc; as punições mais severas às discriminações; a possibilidade de se recorrer ao FGTS para órtese ou prótese prescrita a promover a acessibilidade; a obrigatoriedade das empresas de táxis a reservarem 10% das vagas para condutores deficientes, bem como os estacionamentos a reservarem 2% ou, no mínimo, uma vaga para esta finalidade, e os hotéis a terem 10% dos dormitórios acessíveis, ou ao menos, uma unidade garantida; etc.
Além disso, assegura o direito de vivenciar, constituir uma família, exercer direitos sexuais e reprodutivos, de ir e vir, de se comunicar e ter acesso à informação, tudo para exercer melhor a cidadania sem sofrer preconceitos e discriminações.
Ou seja, a nova lei visa uma vida independente, a autonomia e o exercício de todos os direitos fundamentais da pessoa com deficiência, do nascimento ao envelhecimento, equiparando a falta de acessibilidade à discriminação, de modo a conscientizar todos de um novo modelo social.
Por força das disposições do referido Estatuto e do Novo Código de Processo Civil, muitas coisas foram alteradas no mundo jurídico, diante da grande repercussão e impactos, principalmente, no direito civil e processual, dentre os quais destaca-se que não há mais absolutamente incapazes maiores, sendo que somente haverá a curatela (inclusive, compartilhada) e interdição nos casos de alcoólatras, viciados em tóxicos, pessoas que, por causa transitória ou definitiva, não puderem exprimir vontade, e pródigos.
A partir do Novo Código de Processo Civil, a interdição pode ser promovida, além do cônjuge ou companheiro e dos parentes ou tutores, pelo representante da entidade em que se encontra abrigado o interditando, e pelo membro do Ministério Público, em caso de doença mental grave.
No mais, para requerer a interdição, há necessidade de demonstrar a incapacidade do interditando para administrar seus bens e para praticar os atos da vida civil, bem como o momento em que a incapacidade se revelou, certo de que o juiz confirmará todas as informações, por meio de perícia e entrevistas, com o auxílio de uma equipe multidisciplinar, para que, tão somente após esse trâmite, possa determinar na sentença se a interdição será total ou parcial e quais atos da vida civil o interdito poderá praticar sozinho e para as quais necessitará de curatela.
Ao mesmo tempo, uma nova figura de amparo aos deficientes em geral foi introduzida pela nova legislação, qual seja: a tomada de decisão apoiada, que nada mais é que algo menos drástico que a curatela, já que mantém o direito de decisões para as pessoas que possuem deficiência, mas com algum grau de entendimento, podendo ela participar no comando dos atos de sua vida.
Na realidade, priva-se de legitimidade para praticar alguns atos da vida civil, devidamente indicados, se não houver o acompanhamento de apoiadores, previamente escolhidos (pela própria pessoa necessitada) e nomeados judicialmente. Do mesmo modo que acontece na curatela, o juiz e sua equipe multidisciplinar ouvirão o requerente do pedido da tomada decisão apoiada, bem como os apoiadores eleitos, para então proferir a sentença que produzirá os efeitos então desejados.
Com essas inovações (e outras não esgotadas por aqui), a sociedade terá que se adaptar à pessoa deficiente, dando a ela o devido respeito, todas as condições de acessibilidade e pleno exercício da cidadania. Assim, todos ganharão com isso, uma vez que a caminhada é para que a sociedade seja mais justa para todos.
Ligia Bertaggia
Redes sociais e o CDC
Redes sociais e o CDC
Na era do mundo digital, em que as redes sociais dominam os meios de comunicação, os empreendedores não podem deixar de observar as diretrizes do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Isso porque, em que pese a velocidade com que a informação é transmitida, os direitos dos consumidores devem ser respeitados por aqueles que transmitem a informação e que propagam publicidade pelas diversas redes sociais.
A título de exemplo, podemos mencionar o Snapchat, que caiu na graça do público de diversas faixas etárias, pois é um aplicativo que pode ser utilizado para enviar texto, foto e vídeo, tendo como diferencial o tempo em que o conteúdo compartilhado pode ser visto, se autodestruindo após determinado período. No entanto, em que pese essa autodestruição do conteúdo, isso não impede a responsabilização de quem o veiculou pelo curto período em que esteve disponível para acesso.
Assim, quando da sua veiculação, devem ser observados os direitos dos consumidores, e aqui podemos destacar os direitos básicos previstos no artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor.
Ainda, por ser utilizado como meio de publicidade, devem ser observados por quem veicula a publicidade, principalmente, os incisos III e IV do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, para que sejam transmitidas informações adequadas e claras aos seguidores, bem como não seja veiculada publicidade enganosa e abusiva na rede social, pois a inobservância dos direitos básicos dos consumidores ensejará a ocorrência de vício ou defeito na prestação do serviço de quem veicula a publicidade.
Além disso, deverá ter cuidado para não violar a concorrência, nos termos do art. 4º, VI do CDC. Isso porque a política nacional de consumo visa coibir práticas abusivas, ou seja, possibilitar uma concorrência leal e livre entre prestadores de serviço, garantindo, assim, ao consumidor e aos integrantes da cadeia de consumo, um mercado saudável e sem disputa desleal.
Assim, aqueles que se utilizam das redes sociais para propagação de publicidade de produtos/serviços devem estar atentos à forma que está veiculando, além de como está transmitindo a informação, para que não sofra sanções em razão do vício/defeito na prestação do serviço.
Dessa forma, podemos concluir que, em que pese a velocidade com que a publicidade se espalha nas redes sociais e o público atingido nesta era digital em que vivemos, não há que se esquecer de que os direitos dos consumidores continuam assegurados e vigorando independentemente do tempo de divulgação, razão pela qual quem publica deve se atentar para não ferir estes direitos.
Milena Calori
A Recente Decisão do TJSP que Condenou o Google por Não Excluir Site Fraudulento
A Recente Decisão do TJSP que Condenou o Google por Não Excluir Site Fraudulento
A responsabilidade
civil dos provedores de aplicações de internet por danos decorrentes de
conteúdo gerado por terceiros é um dos temas mais debatidos e controvertidos do
Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14).
Perfis falsos e outras formas de divulgação de
informações inverídicas na internet podem gerar danos irreparáveis às pessoas
que são vítimas da sua utilização, notadamente, em
razão da rápida propagação do conteúdo ofensivo no
mundo virtual.
Com a enorme quantidade
de disponibilizações na internet, de fato, é praticamente impossível uma
análise prévia por parte dos provedores.
Contudo, o que
vinha ocorrendo antes do advento do Marco Civil – com o respaldo de decisões
judiciais (inclusive do STJ) – era a responsabilização das provedoras em caso
de não retirada do conteúdo ofensivo, após o recebimento de notificação
extrajudicial do lesado.
O Marco
Civil veio regular o uso da internet no Brasil, e, com relação à “Responsabilidade
por Danos Decorrentes de Conteúdo Gerado por Terceiros”, assim dispôs no artigo
19:
“Com o
intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de
internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes
de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo
assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente,
ressalvadas as disposições legais em contrário. ”
Ou seja, em
teoria, com o advento do Marco Civil, o provedor de aplicação só seria
responsabilizado em caso de não retirada do conteúdo ofensivo após ordem
judicial.
A única exceção no Marco Civil referente à retirada de
publicações sem ordem judicial está prevista no artigo 21 e trata de tema
especifico: veiculação de material contendo “cenas de nudez ou de atos sexuais
de caráter privado” (denominado pela doutrina de “pornografia de vingança”).
Todavia, o artigo 19 vem gerando muita
discussão entre os especialistas da área.
Aqueles que defendem o artigo 19
justificam a sua aplicação na liberdade de expressão e proibição da censura.
Já
aqueles que são contra justificam que a lei criou proteção demasiada para as
provedoras e reduziu a proteção para os usuários da internet. Além disso, a manutenção
de conteúdo ilícito em nome da liberdade de expressão pode acarretar lesões
irreparáveis aos direitos da personalidade do lesado.
Frise-se,
ainda, que a propositura de ação judicial deixa de ser mero instrumento de
proteção dos direitos da vítima, para se tornar uma condição sine qua non da responsabilidade civil.
E
é justamente ao encontro desse entendimento – contrário à aplicação do artigo
19 do Marco Civil – que a recentíssima decisão da 1ª Câmara de Direito Privado
do Tribunal de Justiça de São Paulo[1] condenou
o Google por não excluir site fraudulento, mesmo sem o descumprimento de ordem
judicial.
No
caso específico, a autora, uma empresa que vende material de construção e
possui apenas loja física, soube que foi criado um site de vendas pela
internet, sem o seu consentimento, mas utilizando o seu nome e endereço e
lesando diversos consumidores mediante fraude, o que causou vários prejuízos à
empresa (reclamações, problemas com a concorrência e até ajuizamento de ações
de consumidores que compraram mercadorias da falsa loja virtual).
A empresa requereu
a retirada do site fraudulento ao Google, por meio de notificação
extrajudicial, mas recebeu resposta no sentido de que não seria tomada nenhuma
medida em relação ao URL indicado, razão pela qual ingressou com a ação
judicial, solicitando a remoção do site e indenização por danos morais.
A sentença de
primeira instância considerou o Google como parte ilegítima, mas o TJSP
reformou esse entendimento. E, justamente nesse ponto, reside a inovação que
torna essa decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, inclusive, emblemática.
A decisão da 1ª
Câmara de Direito Privado foi no sentido de que o
fato de o site fraudulento não ter sido criado e disponibilizado na internet
pelo provedor não afasta a sua responsabilidade pelo conteúdo ilícito.
Apesar
da previsão do artigo 19 do Marco Civil exigir o descumprimento de ordem
judicial, nesse caso específico da decisão do TJSP, o Google foi
responsabilizado por não ter retirado o site
fraudulento quando recebeu a notificação extrajudicial, razão pela qual foi
condenado ao pagamento de indenização por danos
morais no valor de R$ 30.000,00.
Conclui-se, assim, que de acordo com a recente decisão do
TJSP, o artigo 19 do Marco Civil não deve ser interpretado literalmente, sob pena
de ser considerado inconstitucional.
Ao invés da remoção atrelada à determinação judicial, o
ideal seria uma remoção preventiva da página pelo
provedor (após o recebimento de notificação extrajudicial). Esta remoção
poderia ser submetida a procedimento administrativo interno, e, caso nada de
irregular fosse constatado, a página voltaria ao ar.
Como esse tema
ainda é novo e tem gerado várias discussões por especialistas, inclusive na
jurisprudência, acredita-se que no futuro o artigo 19 poderá ser revisto em uma
(eventual) nova regulamentação do Marco Civil da Internet.
, Relator Des.
Francisco Loureiro, julgamento em 07.06.2016.
Andréa Ronzoni
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